terça-feira, 26 de abril de 2011

Saúde da Mulher Negra



As grosserias do deputado Bolsonaro (PP-RJ), representante e sobrevivente da extrema-direita brasileira, e a confusão bíblica do seu colega pastor Marco Feliciano (PSC-SP) – que tuitou que “africanos descendem de ancestral amaldiçoado por Noé”, e que “a África sofre com a maldição do paganismo, ocultismo, misérias, doenças oriundas de lá: ebola, aids” – só foram feitas porque há “proteção” do foro privilegiado e a deturpação do seu sentido.  Ele garante o exercício da livre expressão, mas não o direito de incitar o preconceito e a intolerância.
O racismo no Brasil existe e,  pior,  é um caso de saúde pública, segundo dados publicados por Maria do Carmo Leal, Silvana Granado Nogueira da Gama e Cynthia Braga da Cunha na Revista de Saúde Pública da USP. O debate sobre as desigualdades raciais e suas consequências na saúde é recente. Foi só no fim dos anos 90 que começou a coleta de informação sobre a cor da pele na declaração de óbito e nascido vivo, graças a uma portaria de 1999. Então, a inclusão do campo raça/cor com os atributos adotados pelo IBGE entrou no sistema de dados do Ministério da Saúde.
O que se descobriu foi que os piores indicadores de mortalidade materna no parto são apresentados por mães pretas: cerca de sete vezes maior (275 por 100 mil nascidos vivos) do que entre mulheres brancas (43 por 100 mil nascidos). Pretos e pardos morrem cerca de duas vezes mais por agressões do que brancos: 136, 111, e 72 por 100 mil habitantes respectivamente.
No perfil de mortalidade nos homens pretos entre 40 e 69 anos, doenças cerebrovasculares predominam, mais associadas à pobreza em períodos precoces da vida, do que doenças do coração, que representam a primeira causa de óbito entre brancos.
Nas mulheres pretas entre 40 e 69 anos, a taxa de mortalidade por doenças cerebrovasculares (115 por 100 mil) é cerca de duas vezes maior do que entre brancas (58 por 100 mil). A mortalidade por doença hipertensiva e por diabetes é muito mais expressiva entre as mulheres pretas.
No parto, as mulheres de cor preta e parda são majoritariamente atendidas em estabelecimentos públicos, 58,9% e 46,9%, e nas maternidades conveniadas com o SUS, 29,6% e 32,0%. As brancas, ao contrário, quase a metade, 43,7%, tiveram seus partos realizados em maternidades privadas.
Foi elevada a proporção de mulheres pardas e negras que não conseguiram receber assistência na primeira maternidade procurada. A peregrinação em busca de atendimento foi de 31,8% entre as negras, e 18,5% nas brancas.
A anestesia foi amplamente utilizada para o parto vaginal nos dois grupos. Porém, a proporção de puérperas que não tiveram acesso a esse procedimento foi maior entre as pardas, 16,4% e negras, 21,8%. No momento do parto, foram mais penalizadas por não serem aceitas na primeira maternidade que procuraram e, incrivelmente, receberam menos anestesia.

Fonte: Marcelo Rubens Paiva – O Estado de S.Paulo

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